Milton Sica

Desparceiradas

Milton Sica


Quando uma taça se vai
E outra fica sozinha
O merlot fica sem graça
Sem lágrima, sem bouquet
Taninos exacerbados
Pra uma boca sem sorrisos

A borda é faca afiada
O bojo é um peito vazio
De um cristal que prenuncia
Fissuras inevitáveis
Bailarina solitária
No escuro da louçaria

Taças existem aos pares!
Nada vale serem gêmeas
Em dimensões diferentes
Nada vale um par de almas
Afastadas pelo tempo
Na vida, desparceiradas

Por isso juntei as taças
Pras hastes dançarem juntas
Como corpos que se enroscam
No escuro das madrugadas
Como pés que se procuram
Nas manhãs das invernias