Cimento, asfalto, fumaça, cinza Prédios, esgoto, fumaça Trânsito, caos, fumaça, cinza Vidros, sangue, fumaça A cidade quer respirar Mas existe alguém a lhe sufocar Ar condicionado, água de coco engarrafada Trânsito parado vista pro mar privatizada Caranguejo corre em cima do asfalto Morre esmagado pelos carros caros O som ambiente é zoada de buzina E tem pobre sem teto em cada esquina E os grafites nas paredes insistem em me falar Que a cidade quer quer respirar Mas existe alguém a lhe sufocar Uns com tanto Outros sem nenhum tanto Enquanto a favela sangra o seu suor na pele negra Mutilada pelo sol nos barracos de madeira É, só quem sente ver e sabe como é Trabalhar trabalhar sem conseguir nada construir A meritocracia é utopia e não funciona por aqui Aqui Tom Jobim não seria poeta Sangue nos olhos marginal como Miró da Muribeca E quantos sacos de cimento cabe em ti, Recife? Que sá me coração não fique concreto Quantos sacos de cimento Quantos sacos de concreto Que sá meu coração não fique concreto E os grafites nas paredes parecem me falar Que a cidade quer quer respirar Mas existe alguém a lhe sufocar A cidade é de quem? A cidade é pra quem? Não é só do advogado Ela é do mendigo também Segregação não vai ter basta de covardia Não é só burguês que tem direito a moradia As balas de borracha podem ferir meu corpo Mas minha alma não será atingida É que eu sou da gangue de Caetano lá do Cais do Estelita Que a cidade quer quer respirar Mas existe alguém a lhe sufocar