Às vezes estou na rua, No campo em qualquer lugar E paro pra perguntar, A mim mesmo: quem sou eu? De onde vim? Pra onde vou? Porque é que aqui estou, Qual é o meu paradeiro? Sufocado neste esmo, Eu respondo pra mim mesmo: Ah! Eu sou um BRASILEIRO. Eu sou a força do vento Que açoita a onda raivosa Sou a ponta do espinho, Que se esconde a traz da rosa, Sou a pedra do batente, Sou a água da enchente, Que passa levando tudo, Sou o Brasil dos brasis, Sou um cabôco feliz, Sem a ciência do estudo. É isso mermo!! Eu sou pó Pó de poeira, mardito, Sou a ância do socó, Na busca do peixe aflito. Sou o choro da peitica, O pingo-pingo da bica, Enchendo pote e panela. Sou o caboco de fé, Que anda léguas a pé, No encontro da donzela. Eu sou a dor da topada, Nas pedras que a vida traz Essa topada bem dada, Que vira a unha pra traz. Sou a saudade que dói Derramando água nos zói Do matuto sonhador, Sou o grito das gaivotas, O verso que arranca notas, Da goela do cantador. Sou mandacaru cinzento, Espremido na pedreira, Sou o segredo convento Por trás do manto da freira, Eu sou o medo guardado, Entre os zói arregalado Do mulequim cabeçudo, Que cresce puxando enxada, Finge não saber de nada, Mas é quem sabe de tudo. Sou o Pescador Que canta, Tocando o remo na proa, Numa sexta feira santa, No vai e vem da canoa, O suor que banha o rosto, Do Sertanejo disposto, Cultivando o solo duro, Não se reclama nem chora; Planta uma semente agora Para Colher no futuro. Talvez eu seja um pingente No pescoço desnutrido, De um peregrino sem sorte, Num mundo desconhecido, Sou a casca da madeira Barulho de ribanceira, Na chuva torrencial, Redemoinho nervoso, Lençol de algodão cheiroso Estendido no varal. Talvez eu seja um herbívoro, Comendo a folha que chia, Ou um Gigante carnívoro, Devorando a própria cria, Pois quando chegar meu fim Ninguém vai lembrar de mim, Nem o que aconteceu, De tudo eu serei um nada, Somente um conto de fada Que a mão do tempo escreveu.