Depois de dias viajando encostado num pau-de-arara Amigos de longa data viram cruzes pela estrada Em busca de seu sonho, cidade grande As adversidades são constante Nordestino avanta, vislumbrando a selva do abc Miséria novamente ele vai ver, favelas vão crescer Na fábrica ele não vê o sol nascer Rabo de galo pra friaca rebater O ar que ele respira é venenoso A prensa desce, baiano tá arriscando seu pescoço O frio de são bernardo é cabuloso Seu corpo treme, coração geme, família depende Conhaque na mente fica furioso Escuta a risada do chefe cuzão, se lembra do velho sertão E chora trancafiado no vestiário, percebe que pobre honesto aqui é otário Sujeito homem, sem sobrenome, mais um que foge da fome Vida severina, zica nordestina Bate as asas carcará, não consegue voar Vida severina, zica nordestina Bate as asas carcará, tá pensando em voltar Dedos calejados provam do que é feito o passado Botas de camurça fazem trilhas no asfalto Projetou seus sonhos como nuvens lá no alto Quem que não quer, ter uma casa, carro, família saudável? Sampa é capital da chuva e do polo industrial Desce no terminal, chega atrasado no trabalho O chefe faz seu papel de maquiavel e dá um esculacho Vida do diacho, capacho do sindicato Peão se organizou e a greve começou, polícia chegou, chicote estralou Troca de tapas, borrachadas O vaso não rachou e nem trincou, mas a flor tá quebrada Em meio a madrugada vejo um homem e suas lágrimas Quem é que fez meu mundo cão descer do meu nordeste pro inferno de sião? Encontra o sudeste, cabra-da-peste que faz arte Usado como alicate na linha de produção Começa logo cedo saindo da quebrada Na mochila um uniforme e uma quentinha embrulhada Busão, trem, metrô, varias condução Atravessando a cidade só pra garantir o pão não é fácil não... Ele tem que correr atrás, mata dois leões por dia porque um já não dá mais Patrão não se satisfaz, o trata com antipatia Mas não conhece o gosto de comer marmita fria O corte na peça, firmeza no traço, pegando bloco E cimento só com a força do braço Oreiada do chefe, suportando o cansaço Não é só o bico da bota que tem que ser de aço Cidade é o tabuleiro, vive o jogo de xadrez Linha de frente, peão Sistema aqui é rei Porcos capitalistas, maldade que prolifera Tão comendo dinheiro fodendo com a atmosfera Não assimila o motivo de tanto sofrimento Sem água tratada a panela cozinha o vento De joelhos faz a prece mas não descansa a mente Seu castelo de madeira pode ir com a enchente... Rugas de expressão são marcas da pele sofrida Sonhos são poeiras levantadas em cada varrida Corpo mente e alma se encontram abatidos Pisar em cacto era bem menos dolorido...