Abrindo um velho baú que me sobrou como herança Aonde guardo as lembranças do tempo que eu fui peão Senti uma dor profunda a alma quase desmaia Revendo aquela "traia" que foi o meu ganha-pão Ali naquele instante de semblante abatido Senti fluir do tecido do velho poncho surrado Um forte cheiro de terra, de terra lá do sertão Quando as chuvas de verão... regavam o chão sagrado Peguei o poncho nos braços e no fundo do baú Meu laço de couro cru me fez sonhar acordado Ao vê-lo enrodilhado tal e qual uma serpente Com os tentos de minha mente fui trançando o meu passado Ali de olhos fechados Me vi cortando estrada Transportando uma boiada de mais de mil pantaneiros E na virgem do sonho, com a alma delirante O repique do berrrante... Me arrepiou por inteiro A seriema cantava nas campinas verdejantes E meia légua distante seguia o berranteiro A tarde estava tão calma que de longe se ouvia O eco que repetia o grito dos boiadeiros O sol foi se escondendo e um temporal medonho Tirou-me daquele sonho que tão feliz eu vivia Aí que foi que notei com amargo desencanto Que a chuva era o pranto.. Que dos meus olhos caia Sentindo a realidade, me vi num triste abandono Igual matungo sem dono no campo abandonado Quem foi peão estradeiro no tempo de mocidade No inverno da idade, no mundo vive alongado Por isso vivo esperando que a morte passe num upa Nem que seja na garupa me leve pra eternidade Pois quando meu velho corpo repousar no frio chão De minha vida de peão... Não vou mais sentir saudade