Lá vem na beira da estrada Andando a pé um ligeira É tão comum na fronteira Ver esse tipos assim Cumprindo um fado sem fim Sujos, feios, cabeludos Esfarrapados, barbudos Com um grande saco nos ombros Taperas vivas, escombros Gaguejando, quase mudos Dizem que roubam crianças Que levam dentro de um saco Que se escondem num buraco Que falam com lobisomem Que são mais bichos que homem Sem eira, nem beira Passei uma infância inteira Nos pagos que me criaram Quantas vezes me assustaram Com a ameaça do ligeira Mas eu falei com ligeiras Depois que cresci um pouco Nenhum deles era louco Ou fazia mal pra alguém Tinha, tiveram ou tem Uma razão para a vida Alguma coisa querida Que ficou de seus passados E assim procuram coitados Esse miragem perdida Sempre buscando por algo Que está por trás do horizonte Talvez um sonho de fronte Uma estrada a percorrer Assim vão até morrer Partindo de um arrebol No peito rufa um tarol Sem parar na encruzilhada E hão de cair numa estrada No último pôr-de-Sol Quando meu filho crescer Vou lhe contar que o ligeira Que caminha vida inteira Não é ladrão de criança Que tem sonhos e esperanças Como qualquer ser humano Que o seu destino aragano Guarda um segredo profundo Que é o mesmo nosso no fundo Mesmo que a gente não queira Todos nós somos ligeiras Pelos caminhos do mundo