Júlio Nobre

Aquela Vaca

Júlio Nobre


Brinco de passar o tempo de uma maneira lenta
Tudo no mundo é movimento
Até a fome que no fundo me alimenta

Sei que a vida é uma guerra, mas não precisa ser sangrenta
Vejo a pá que me enterra, cobrindo-me de terra barrenta
A morte que me espera é lenta

Tenho alucinações insensatas, vasculho a origem do universo
Sei que na terra existe prata, mas o que existirá no meu verso?
Uma mensagem decifrada ou um sentido submerso?
E quando encontro ele me escapa e quando escapa não é mais verso
Sou um jogo de palavras que se perdem no concreto

Sei que a vida é exata, é exatamente o que eu penso
Que não se mata com uma faca, talvez com cheiro de incenso
A minha carne é tão fraca... Silêncio

Brinco de passar o tempo de uma maneira lenta
Tudo no mundo é movimento
Até a fome que no fundo me alimenta

Aonde vai aquela vaca que pasta displicentemente?
Ela não percebe que a vida é babaca?
Como as pessoas, nem sente
Muito burra aquela vaca que pasta displicentemente

O meu coração extravasa toda alegria que não sente
Como as pessoas que se julgam felizes em suas casas dementes
O meu coração extravasa uma vaca, displicentemente

Da vida só necessito saber onde esconderam a poesia
Pois não consigo ver onde caberia no meu ser
Aquela vaca que pasta displicentemente

Brinco de passar o tempo de uma maneira lenta
Tudo no mundo é movimento
Até a fome que no fundo me alimenta