José Mário Branco

Cantiga do Fogo e da Guerra

José Mário Branco


Há um fogo enorme no jardim da guerra 
E os homens semeiam fagulhas na terra 
Os homens passeiam co´os pés no carvão 
que os Deuses acendem luzindo um tição 

Pra apagar o fogo vêm embaixadores 
trazendo no peito água e extintores 
Extinguem as vidas dos que caiem na rede 
e dão água aos mortos que já não têm sede 

Ao circo da guerra chegam piromagos 
abrem grande a boca quando são bem pagos 
soltam labaredas pela boca cariada 
fogo que não arde nem queima nem nada 

Senhores importantes fazem piqueniques 
churrascam o frango no ardor dos despiques 
Engolem sangria dos sangues fanados 
E enxugam os beiços na pele dos queimados 

É guerra de trapos no pulmão que cessa 
do óleo cansado que arde depressa 
Os homens maciços cavam-se por dentro 
e o fogo penetra, vai directo ao centro