Há tempos sonho com a fé de que o cansaço que me aflige seja o mesmo que castiga os outros homens. Esses homens que na rua desnudam o peito pegam boi brabo pelo chifre e riem da morte. - É deles a noite. Esses homens lustrosos de sol edificadores do mundo, graças a eles, sem o perceber, sobrevivo. Sobre seus alicerces caminho, mas logo me canso. Atrás de seus calcanhares, progredimos. Leite, pão, carne, lençóis limpos e quentes e a vida já não é mais tão desastrosa, pesada e trágica. Mas amparado em seus ombros de titãs, carrego algo inimaginavelmente mais pesado. Sabe-o o talo das flores, a sustentar suas corolas com as pétalas e sua gota de orvalho. Sabe-o o caule dos cogumelos as asas da mariposa que transportam o necessário pólen. Sabe-o a mão do vento que conduz a pluma dançantes folhas secas, um fio de cabelo, o mais mínimo grão de areia. Há tempos carrego algo mais pesado que a asa de uma esperança.