Isabel Sougarret

Tragedia Em Quatro Atos

Isabel Sougarret


Carnaval acabou
Cores descem pelo ralo
Cinzas se espalham pelo resto do ano

Guarde os desejos na gaveta
Vamos às tarefas intermináveis
Hora de vestir sua fantasia todo dia
E usar a sua máscara social

Se arrancar de si
Pra máscara caber melhor
Se encaixar no molde
Pra evitar a dor

Os cachorrões precisam de seus domesticados
Pra manterem o luxo dos seus palácios
Os cachorrões convencem os seus domesticados
De que a vida se resume aos seus cubículos

Suas rações
Decorações
Infinidade de supérfluos

Os cachorrões jogam o osso
Fecham a jaula
Sussurram sorrindo
Que lá fora mora o perigo

E mais uma vez você se tranca
No território de sua segurança
Assiste mais do que vive
E só deseja também ser assistido

Não importa o que vai ser dito
Nem conteúdo nem forma
Palavras soltas
Ocas
Descartáveis
A se debater

Será que o ato de pensar
Não vai entrar no nosso currículo?
Será que a humanidade quer pastar
Ou desbravar novos caminhos?

Só lixo sonoro
Pairando entre mentes
Em formas gasguitas
Rebolam nos inconscientes

E o lixo sonoro
Cuspido nesse ambiente
Em forma de gritos
Das bocas da TV
Aos pratos

Mais uma vez você se cala
E se entope de desgraça
Que só engole com cachaça

Será que o ato de pensar
Não vai entrar no nosso currículo?
Será que a humanidade quer pastar
Ou desbravar novos caminhos?

O costume de parasitar
É um consolo por ser parasitado
A vontade de domesticar
Vem do costume de ser domesticado

Seu capacho mora ao lado
Muito cuidado
Com o carrasco que existe em você
Ele pode te pegar

Experimente saltar pro outro lado
Pra ver o que você faria
Com o você do outro dia
Experimente emergir
Do próprio umbigo
Pra ver o que você veria

Será que o ato de pensar
Não vai entrar no nosso currículo?
Será que a humanidade quer pastar
Ou desbravar novos caminhos?