Chullage

Princípio do Meu Fim

Chullage


Odeio vê-la
Sempre a ajeitar aquela moldura
Com lágrimas a cair
Por cima da roupa escura
Ainda sonha que um dia estou lá
Quando ela acorda
Tirando ela
Já pouca gente de mim se recorda
No inicio puseram o meu nome
Em T-shirts e tattoos
Com as minhas datas
Um Rest In Peace e uma cruz
Eu era o tema das rimas
À noite falavam de mim
Enquanto despejavam cerveja
E as vezes whisky e Drambuim
Desceram-me ao fundo
Sete palmos abaixo do chão
Minha mãe desmaia
Enquanto seis manos carregam o caixão
Tudo o que vejo são
Roupas pretas, muitas flores
Grande multidão
Muitos gritos muitos choros
Foi uma bomba que deixou
O bairro todo de boca aberta
Ainda ontem estava ali
Com bros na procura e oferta
Deus levou-me o último suspiro
Senti o ar a ir, frio a subir
Eu a cair, depois do balázio do tiro
Dum shot premido por um baba a rir

'Tava de costas pra ele
Correndo à sua frente
E quando me virava pra ele
Pensava que hoje seria o dia
Que Deus me tiraria desse pesadelo
Correndo desalmado
Dava nas esquinas com o fim
De conseguir fugar
Mas o gajo dava nas esquinas
Atrás de mim
Desde a porta do ourives
Dois deram de lado, eu fui em frente
E condutor logo em cativo será que algum tá vivo
Ficamos cercados
Quando a mona chegou
Três minutos de ganância
Depois de que o alarme soou
A montra estalou
Carrinha em marcha atrás
Caçula, cartuxos
Caso algo corresse mal
E aparecesse o xuxo
Tudo bem combinado
Nada correria ao contrario
Um ano sem emprego
Precisava desse salário
E a dama sempre a dizer
Que me queria longe disso
Pra que quando o puto nascesse
Ainda me visse
Tinha 'tado na obra
Andaimes massa picareta
Já me tinha arrependido
De ter largado um caderno e uma caneta

Escola larguei no 10º
Farto de ver a cota no cansaço
A esfregar o chão desses fdps
Com Sonasol e esfregão de aço
No fundo ainda éramos escravos
Eles mentiam nos livros
E se dependesse deles
Nós nunca seriamos livres
Tratavam-nos como tratavam
Plantas, peixes, aves e mamíferos
Usavam-nos e depois fechavam-nos
Em ambientes mortíferos
Política no rap não dava vida
Fui cagando aos poucos
As minhas rimas não punham putos e putas aos saltos loucos
Sempre em stress com a dama
Que isso não era nenhum emprego
E os rappers que se safavam
Tinham todos dado o rego
Do bairro onde vim
Niggas não papavam sucker M's
Rap continuava a ser a rua
De gangstas, babilones, INEM's

Cresci a ver isso: Drogas, armas
E outras paranoias
Desemprego, racismo, violência, ganancia
Dillas com botes e joias

Cresci a ver isso: Drogas, armas
E outras paranoias
Desemprego, racismo, violência, ganancia
Dillas com botes e joias

Tudo o resto matava-se um mês
Pra ver 3 números num cheque
Tudo o resto eram estudantes
E empregados de balcão num MC
Pedreiros, empregadas de limpeza e de cozinha
Todas as mães sofriam
Eu queria, outra vida pra minha
Que vinha cansada buscar
O meu mano mais novo na vizinha
E ainda tinha
Que preparar o jantar e o almoço de amanhã, tadinha
Raramente podia descansar os pés
Frente a um ecrã
A olhar pra'a uma novela
A sonhar com uma vida bela
Era trágico quando ela
Saia pra lá daquela porta
Recebia mal, mas os todos os dias ela saia de lá morta
E aumento nunca deu
Cabrão capitalista
Por isso limpava em 2 lugares
E nunca nos punha a vista em cima
A rua é uma babbysitter
Que não te abraça nem te mima
Transferi o ódio pra'á rima
Fazia guerra e não arte
Farto
De ser sempre o perto da turma
O colega posto de parte
Farto
Da água a entrar pela telha
Farto da luz cortada
Farto de ratos em casa
Farto do esgoto â entrada
Farto duma mãe que aceita tudo pra manter
A família unida
Farto dum pai que só está quando quer
Quando não quer dá corrida
Não bastava eu outro irmão nasceu
Pra crescer assim
4 anos depois de mim
4 anos antes, nascia eu
Esse era o principio do meu fim