Nosso brasil, Acompanhe a minha idéia, Foi atlantida e pangéia, Um sertão que já foi mar. Já foi rodínia, Foi panótia e gonduana, Era belo e bacana Antes de cabral chegar. Também foi ilha Do brasil, de são brandão, Vera cruz, nome cristão Trazido do além-mar. Foi pindorama, Foi terra de santa cruz, Papagalis, meu jesus, Depois de cabral chegar. Este país Te tesouros, tem arcanos, Tem mais de trinta mil anos De histórias pra contar. São trinta mil Em que o índio te vez, Quinhentos que o português E o negro chegaram cá. Aí, um dia, Eu senteda na cadeira, Um estalo-de vieira Clareou a minha mente. Eu percebi Que tinha de procurar Descobrir e encarar Minha terra e minha gente. E sem demora Minha burra eu selei, Pus um cabresto e montei, Pus espelho e um radar. Pus uma bússola, Astrolábio e luneta, Diário, mapa e caneta, E falei: ´vou viajar´. E mesmo antes Do sol, do cantar do galo, Do sino bater badalo, Eu saí pelo caminho... Os cascos dela Velozaes matraqueavam, Pareciam que estavam Tocando ´brasileirinho´. Cavalgar, cavalgar Eu cavalguei. No páis dos brasileiros Conheci o mundo inteiro E por ele eu passeei. No meu galope, Mais ligeiro que um corisco, Eu cruzei o são francisco, Mergulhei no iguaçu. Fui despertar No sol da zona da mata, Vestido de ouro e prata, Dançando maracatu. Passei por todas As ladeiras de olinda, E muita morena linda Ainda se lembra de mim... Cantei seresta, Tirei verso na ciranda, Toquei tuba em uma banda, Na outra toquei flautim. No meu caminho Enchi o brasil de pernas, Até chegar nas cavernas Da gruta de maquiné. Voltei de lá Com um papiro na mão, Trazendo a decifração Dos segredos de sumé. Eu vi xamãs Dominando tempestades, Cavando sete cidades, Separando marajó... Vi o profeta Puxando com sua cruz Cada órfão de jesus Que cruzou cocorobó. Cavalgar, cavalgar Eu cavalguei. No páis dos brasileiros Conheci o mundo inteiro E por ele eu passeei. Fiz um almoço Lá no ´buraco da jia´, Começou ao meio-dia Terminou pela manhã: Cuscuz com fava, Bode assado, dobradinha, Macaxeira com farinha, Codorniz e ribaça. Bolo de milho, Marisco no vinagrete, Feijoada com croquete, Quitute e baião-de-dois. Comi de tudo Sem pressa, sem me cansar, Só para me preparar Para o que vinha depois... Arroz-de-polvo, Risoto de camarão, Maionese e macarrão, Salpicão, frutos do mar, Feijão-macassa, Galinha de cabidela E um bife de panela Bem leve, pra descansar. Um ensopado De carne com batatinha Feijão-verda e farofinha, Sanduiche de peru. Pra terminar Um conhaque, um cafezinho, Mais um cálice de vinho E três de pitu. Cavalgar, cavalgar Eu cavalguei. No páis dos brasileiros Conheci o mundo inteiro E por ele eu passeei. Porém um dia Eu cruzei em meu caminho Com um cavalo-marinho Que era gêmeo com o meu. Puxei a rédea Fiquei olhando pra ele, Ele achou que eu era ele, Eu achei que ele era eu. Nesse momento Mais um galope se ouviu, Outro cavalo surgiu Passando perto da gente. Uma figura Semelhante e parecida, Mas como tudo na vida Tinha algo diferente. E mais dois outros Chegaram no mesmo instante, E logo mais adiante Outro ainda apareceu. Eu que pensava Que era único no mundo Encontrei num só segundo Muitos outros como eu. Saí puxando A cavalhada marinha, Parecia idéia minha, Parecia carnaval. Fomos dançando Na ponte do arco-íris, E quando eu rodei o pires Apurei quase um real. Eu virei noite Galopando esse país, De metrópoles febris E esquecida imensidão. Vi a coragem De quem enfrentou a morte, Vi um vento lá do norte, Vi a vela em minha mão. Vi uma luz Branca, azul, aparecida, E uma mulher parecida Com aquela lá do céu. Vi tantas luzes Que lembrá-las é revê-las, Tantas luas e estrelas Entre as rendas do seu véu. E da mão dela Uma luz se projetava, E essa luz me apontava Uma tróia no sertão. Uma muralha Dentro dela uma cidade, Fora dela a crueldade, A morte e a escravidão Era o quilombo Lá na serra dos palmares, Erguendo alto nos ares A bandeira de zumbi. Saltei da burra, Devagar fui caminhando, Me cheguei, fui escutando O que acontecia ali.