A minha adolescência eu passei distante dos meus pais Tem muito mais, na vida eu nunca tive paz Na minha família o quebra quebra o desamor Meu pai várias vezes bêbado me espancou Me humilhava na frente dos amigos da escola Não deixava eu sair pra jogar bola Minha mãe doente, com crise depressiva Ematomas foi o que restou da briga No corpo de delito constou Foi espancamento e meu pai o agressor Me lembro como se fosse agora o desespero Até me arrepia lembrar o pesadelo Eu só estava pele e osso, minha vida um cativeiro Vi meu pai embreagado em um puteiro Meio dia nem um prato de comida Minha mãe chorava e clamava pela vida Minha mãe saiu de casa um dia cheia de razão Meteu o ferro e enquadrou o buzão O cobrador reagiu sem ter noção E ela disparou dois tiros de oitão Na carne, na navalha, no destino, na surpresa Dennis, a tia veio avisar que a sua mãe está presa Na sequencia ela tentou aliviar minha tristeza A tia trouxe um chocolate para você, vou deixar em cima da mesa Cadê meu pai meu herói meu guerreiro Minha consciência, relata o paradeiro Deve estar lá Sendo zoado caido no chão bebado sujo sem dinheiro Mano, eu só tinha onze anos de idade Meu herói sumiu sem dignidade Jogou na lama a honrra e a simplicidade Pra mim o que sobrou foi o mundão e suas vaidades Já pensou mano, ver sua mãe chorar Porque não teve chances de amar Se juntou com um canalha engravidou estou aqui Sem motivos pra sorrir Do que me importa o seu carinho agora Se pra mim, a vida terminou Eu me lembro que os parentes foram os primeiros que se afastaram de mim Mas aí, eu vou até o fim Me negaram um prato de comida, que desgosto Me fizeram beber agua do esgoto muitos me chamavam de escroto Diziam que a qualquer momento eu estaria morto Detonado na maldade pelos porcos Ou internado em um hospital de loucos É triste, só quem sofre, sabe o que é sofrer Chegou uma hora que eu queria até morrer Mas não, vida real manchada de sangue Necessidade, ambição, bang bang Só quem é, sabe como é Sobreviver, na luta e na fé Diagnóstico da paz pra mim não funcionava Olhando as vitrines eu imaginava Já pensou eu nesses panos loucos, mó estilo Aos onze anos já queria tudo aquilo Uma calça, uma peita, um tênis mil grau Uma lupa preta e um boné estilo mau Abaixo da linha da pobreza irmão, é o fim do mundo Meu sonho não durou nenhum segundo Olhei de lado MC`Donalds lotado Os boys sorrindo, e eu aqui calado Mamãe foi condenada a vinte anos de penita Demorou, mas me mandou um bipa Eu chorava em cada frase que eu lia Eu era simplesmente, refém da agonia Perdi o contato assim que fiz meus doze anos Jogado no mundão, só bandidagem, vários manos Nessa faze irmão, perdi a noção do tempo Mó saudade da minha mãe quanto tempo Meu pai fiquei sabendo, pede esmola lá no centro Descabelou, eu lamento Já pensou mano, ver sua mãe chorar Porque não teve chances de amar Se juntou com um canalha engravidou estou aqui Sem motivos pra sorrir Do que me importa o seu carinho agora Se pra mim, a vida terminou Eu tinha um sonho, eu queria estudar Ter conhecimento, talvez me formar Mas a sociedade me esqueceu nesse lugar Se eu contar a realidade pra você mano você nem vai acreditar Na história da sociedade em um retrato estava eu Com uma arma de verdade herói dos pobres, ateu Uma espécie em extinção ladrão, mas não rara Sofreu e angustiou irmão, quem vos fala Gritos no silêncio, clamando pela vida Aos vinte e sete de idade a mesma fita Meu pai morreu fiquei sabendo, é triste Nem fez diferença, mas aí, quem resiste Cadê minha mãe pra me ajudar Um gesto, um abraço, já ia me acalmar O desespero às vezes leva um homem ao suicídio E o descaso é gerador do genocídio Que se prolifera nas favelas Imagens, ibope, todo mundo ligado na tela Milhões de pessoas ao mesmo tempo sendo alienadas É guerra civil, não conto de fadas Aqui no Brasil prisão sem muros, miséria O sangue ferve nas artérias É agora mãe, chegou minha vez Quem sou eu, quem é você, quem são vocês, eu? Sou revolucionário, natural por natureza Sem privilégios, sem caviar na mesa Cheio de certeza, o predador a presa Longe, longe da riqueza Vivendo no limite com frieza Lembrem de mim com fartura na sua mesa Lembrem de mim, um exemplo de abandono Cachorro louco sem dono Chegou minha hora, não se apavora Adeus, falou, estou indo embora Aos vinte e sete sem motivos pra sorrir O que eu estou fazendo aqui