Eu queria ter os lábios sábios E poder saber dizer palavras belas E como um pintor achar, prender as cores Entre flores luminosas, amarelas Eu queria ser só ritmo e som Ouvir a clara, lúdica música das esferas E matar os medos na raiz E feliz cantar rondós sem dor Depois de ter domado as feras Eu queria poder rir e celebrar o amor Beber, brindar à vida Esquecer a funda ferida Só por um segundo Crer que enfim o mundo É um lugar gentil Pros meus, pros seus Eu queria que Deus acordasse Do seu sono profundo Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Aqui na solidão! Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Em paz na solidão! Eu queria que o amor Significasse mais que amor Somente uma palavra bela Que vaga ao relento Nos sonetos, guetos da poesia, romances na tela Ser afeito ao afeto, farto, forte, franco Repleto de emoções sinceramente sentidas Viver todas as vidas com a intensidade De mil corações Para além deste comércio infecto De tatos, gostos e olfatos Esse teatro pífio, ímpio, falho, tosco, triste Queria gritar o grito que existe Silenciado na garganta Enquanto a alma canta Por todo gesto gasto e terno Que quer o eterno éden Neste inferno idem Tola vida em suma, vida uma Coisa alguma sem nenhuma Mínima chance de redenção Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Aqui na solidão! Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Em paz na solidão! Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Aqui na solidão! Ó tarde dos meus dias! Ó noite da minha alma! A vida era tão calma Em paz na solidão!