Vitorino

O Maltês

Vitorino


Em Cerro Maior nasci. 

Depois, quando as forças deram 
para andar, desci ao largo. 
Depois, tomei os caminhos 
Que havia e mais outros que 
Depois desses eu sabia 

E tanto já me afastei 
Dos caminhos que fizeram, 
Que de vós todos perdido 
vou descobrindo esses outros 
Caminhos que só eu sei. 

Veio o guarda com a lei 
No carro das carabinas. 

Cercaram-me num montado; 
puseram joelho em terra; 
gritaram que me rendesse 
à lei dos caminhos feitos. 
Mas eu olhei-os de longe, 
tão distante e tão de longe, 
o rosto apenas virado, 
que só vi em meu redor 
dez pobres ajoelhados 
perante mim, seu senhor. 

Gente chego às janelas, 
saíram homens à rua: 
- as mães chamaram os filhos, 
bateram portas fechadas! 
E eu, o desconhecido, 
o vagabundo rasgado 
entre o largo da vila 
enter dez guardas armados; 
- mais temido e mais armado 
que o deus a que todos rezam. 

- Que nunca mulher alguma 
se rendeu mais a um homem 
que a moça do rosto claro 
ao cruzar os olhos pretos 
com o meu olhar de rei! 

...E vendo que eu lhes fugia 
assim de altiva maneira 
à sua lei decorada, 
lá, 
longe do sol e da vida, 
no fundo duma cadeia, 
cheios de raiva me bateram. 

Inanimado, 
tombei por fim a um canto. 

E enquanto eles redobravam 
sobre o meu corpo tombado, 
adormecido 
eu descansava 
de tão longa caminhada!...