Com diamantes de gelo Em cada fio de cabelo Das pedras nasce um novelo Que aos poucos se movimenta Sem dar adeus à nascente Parte como uma serpente Engole o que vê na frente Engrossa, arrasta e aumenta E o rio de água cinzenta Cospe, empurra, rasga e roça Tatuando a pele grossa Do chão de carne barrenta Com pontas finas de agulha Uma pequena fagulha Se enrosca, se desembrulha E cobre o que lhe cobriu Vira uma cobrinha arisca Toda de brasa e faísca Que estica o corpo e se arrisca A ver o que nunca viu E assim o fogo febril Deixa atrás desenhos pretos Enquanto os mil esqueletos Que na passagem buliu Com manchas avermelhadas Nuvens esbarram pesadas E anunciam trovoadas Depois que o sol cai cansado Um pássaro silencioso Voa atrasado, ansioso Pousa num galho espinhoso Onde a voz tinha ficado E o som de cada trinado Cada assovio, cada açoite Poda nos mantos da noite Um castiçal estrelado