Parabéns pra mim, muito obrigado Minha mãe é prostituta, meu pai desempregado Moramos num barraco de 2 metros quadrados Com a mente vazia, sem comida no prato Eu não tenho tempo pra jogar bola Carrinho de papelão me acompanha com a cola Não tenho um caderno, livro pra mim ir pra escola Pro leite do meu irmão, no farol peço esmola Aí o boy do Audi me nega 1 real, fecha o vidro Me nega 1 real e ainda sai sorrindo? Parece um campeão que ganhou um título E gasta com farinha na boca do lixo Não tenho bola, mesa, festa, nem som Se eu quiser um presente, mando um pro caixão Não ganhei Fórum, Zap, Ripcurl nem Hang Loose Uma calça furada, sem camisa e um Kichute É verão, graças a Deus, até que enfim chegou! Porque eu durmo na rua, não tenho cobertor De dia ficou embaçado, eu passei um veneno O segurança do mercado me deixou uns ferimentos Eu fui roubar pra comer, ele bateu em mim Peço a Deus pra que o filho dele não fique assim Acho que vou ficar na rua, nem vou voltar pra casa Pra ver meu pai injuriado e minha mãe viciada É meu oitavo aniversário, eu consegui sobreviver Mas no 14º cê vai ver o que eu vou fazer Com uma 9 na mão, se pá teria uma revanche Furtar um BMW, levar pro desmanche Pegar um barão, pôr alimento no barraco Olhar pra minha mãe, chegar, dar um abraço Pegar o som velho do vizinho emprestado Comemorar o meu 14º aniversário Ae, criança chora Criança implora Só que se não der educação A alimentação agora Depois não vem reclamar Do sangue que vai sair da pistola Qual a alternativa? O que é que eu faço? Sou mais um largado, caído, jogado Já pressinto meu futuro, eu vou virar um monstro Que mata o playboy por um café de 1 conto Se minha mãe tivesse pelo menos um trabalho E garantisse que ia entrar comida no barraco Mas sem estudo e aparência a vaga é negada, limitada A burguesa não quer nem pra limpar casa Sei de tudo aí, eu tô ligado Por que é que meu pai não arruma um trabalho Ele tem uma bronca, é ex-presidiário Teve que traficar, acabou comida no armário Se eu sou o futuro do Brasil, como diz na tela O futuro dessa porra é se acabar na guerra Quando eu lembro que a minha mãe vende o corpo pros playboy O sangue sobe, a alma ferve, o coração aperta e dói É tipo transformação, estilo mutação Do moleque inocente ao vilão com oitão Com microfone na mão, na TV a mulher Dizendo que o caminho certo segue quem quer Mas onde eu busco a esperança? Onde eu busco a fé? Maomé foi à montanha ou a montanha a Maomé? Muitos que estão no Ibope por aí Vieram daqui, mas se esquecem de mim, morô? Criança Esperança nunca foi em casa Show beneficente não me deu cesta básica Eu prefiro morrer pra acabar com a agonia Deixar um prato a menos pra minha mãe na lista Mas que nada, eu não vou morrer à toa E não recompensar o sofrimento da minha coroa O dia inteiro eu no Sol, na esquina do farol Com a minha arma de brinquedo, jogador de futebol Não tive a sua sorte, deixa a carteira O relógio, a corrente, se pá a disqueteira Aí, eu sou o moleque do farol sanguinário Que rouba o playboy e comemora o aniversário Vejo vários boy na televisão Acenando uma pomba com a palma da mão Não aguentando a violência que o país criou É o pavio que ele acendeu Click, cleck, bum! Estourou O corpo quente, a alma treme O tiro do tenente, covarde PM Só porque eu roubei o colar da tiazinha Não faz falta pra ela, mas é a comida da minha família Dentro da ambulância eu lembro dos tempos passados Eu tentava ser humilde, pivetinho honrado Tentava vender chiclete dentro do metrô Mas o urubu de farda preta veio, me pegou, morô? Me espancou com o cassetete, me humilhou Depois ainda quer que eu vire um trabalhador? Eu me lembro do lixão, garimpando com a mão Tentando achar comida espalhada no chão Agora eu tô entendendo a verdade nua e crua O mano de terno e gravata vem aqui, me empurra O moleque na frente do teatro, na calçada Pro empresário candidato não significa nada O artista da TV sabe condenar Mas não dá um emprego pro meu pai trabalhar Os maluco da TV sabe até falar, criticar Mas na hora H, quem vem ajudar? Põe dinheiro, põe comida aí na minha cruz Quem sabe eu morrendo agora eu encontro Jesus Não sou o último, nem o primeiro O Brasil é uma merda e os moleque é herdeiro