-Cegos? Quem são? -Cegos são aqueles que não enxergam. -Então eu não sou cego porque enxergo; mas será que vejo? Eu não vi aquele pássaro que nas manhãs vem cantar pra me acordar, mas ouvi. Não vi a queda das folhas derrubadas pelo vento que soprou ontem a tarde. Sabe que existe poesia em ver as folhas cair? Há uma árvore plantada na calçada e passando por ela não vi que não é uma, mas sim duas árvores que se entrelaçaram, se abraçaram, dando a impressão de ser uma só. Não vi o rosto daquela pessoa que me pediu uma informação. Não vi as cores que cobrem as paredes das casas. E as formas então? Não vi. Há uma casa bonita ali na esquina que tem um telhado cheio de inclinações mas eu não vi. Jardins? São muitos. A "dona coisinha" tem um monte de ervas cultivadas pra chá em inúmeros potinhos de margarina de diversas marcas mas eu não vi. O "seu coisinho" colocou umas plantas grudadas na árvore da calçada em frente sua casa. A gente anda pelo mundo e não nota a diversidade de cores e formas que ele nos oferece. Não para pra ver. Apenas ver. -Ver o que? -Ver que o sentido da visão é tão maravilhoso e que muitas vezes o desprezamos. -Parar pra quê? Parar pra pensar, e ver, não apenas com os olhos, mas com a mente. Ver com o coração, Ver com os ouvidos. Um sentido que não pertence apenas aos olhos. ...se enxergar já é um privilégio, é preciso começar a ver também. Se tivesse, além de enxergado, visto, teria aproveitado bem mais os segundos, os minutos, as horas, as semanas, os meses, os anos, as décadas... e não teria pisado naquele... bosta!!!!... cocô de cachorro.