Regrido em ti, querido diário Escrevo em ti, novos rabiscos De velhos roteiros diariamente Insuportavelmente cumpridos De todos esses animais Sou o único confortável em minha jaula Onde repouso e à ti regresso Sou só um palhaço, entretanto, entre tantos outros artistas: Dominador de fogo, sanguinário ilusionista, Domador de feras, virtuosos trapezistas, Criaturas abomináveis, musas egípcias, Atirador de lâminas, acrobatas suicidas, E a mais bela e pura flor, a marcela bailarina Quem tentar ter uma flor sentirá seu belo cheiro E aspirará sua beleza mas deverá se entregar de corpo inteiro Assim como tudo na vida nem tudo na vida são flores Vidas são flores Respeitável público e com vocês: O incrível, notável, fabuloso, espetacular, radiante, nobre e original: Circo miscelânea Te escrevo vero pois estou sem maquiagem Sem meus sapatos gigantes sem meu falso nariz E sem marcela, minha flor radiante Vestida de ouro em movimentos sutis O escorregar de seu corpo em meio aos tecidos Trança em transe a dança desse universo A sua força desafia a lei da gravidade Criando música em delicados gestos Tenho em memória a revelação de cada cicatriz Maquiadas pelos voos rasantes intensamente aplaudidos Tenho em memória todos os laços e giros do seu corpo Atados nos véus do céu, no alto Do céu, no alto Todo anjo pode cair um dia Todo dia não é dia de acertar Em uma de suas quedas Marcela bailarina se esqueceu de acertar E a levo em minhas mãos Princesa adormecida que precisa retornar Deitada em minha jaula Um beijo proibido fez a bela despertar Seus olhos disseram: Não! Seus braços disseram: Longe! Seus lábios disseram: Nunca vamos nos amar Somos pobres proles de um incesto Em nossas veias correm sangues iguais Não vamos cometer o mesmo erro Te digo vero, então me deixe em paz Adeus, até nunca mais