Adriano Gonçalves de Macedo Homem de cabedais e alma sem siso Penetrou no seu quarto com um sorriso Às dez horas da noite, muito a medo Uma carta de amante, era um segredo Ia abri-la, e, assim, era preciso Que a sua esposa, dama de juízo Não na visse nem mesmo por brinquedo Dona Corália Augusta Colavida Estaria nessa hora recolhida? Levantou a cortina, devagar Mas, que tragédia após esse perigo Viu que a esposa beijava um seu amigo Sobre o divã, da sala de jantar No belo palacete do Furtado Palestrava a galante Mariquita Com um pelintra afetado, assaz catita Bacharel delambido e enamorado De sobre a grande cômoda bonita Toma o moço um livrinho encadernado Revirando-o nas mãos, interessado Mas a jovem retoma-o, muito aflita Esse livro, Antonico, é meu breviário! Diz inquieta. E ele, cínico e falsário Arrebata-o às frágeis mãos trementes Abriu-o. Mais o olhava e mais se ria Era um compêndio de pornografia Recamado de quadros indecentes Dom Castilho, notável latinista Realizara alentada conferência Sobre rígido assunto moralista Protegido dos membros da regência Foi um sucesso. E a esposa Ana Fulgência Nele via uma grande alma de artista Louvando-lhe a utilíssima existência De homem probo e notável publicista Que primor de moral! E os companheiros Escritores, poetas, conselheiros Foram levar-lhe um abraço camarada Numa corrida louca, esses senhores Foram achá-lo em seus trajes menores No apartamento escuro da criada