Aqui não é mais o campo tampouco será cidade Aqui se levantam ranchos na boca dos arrabaldes Nem o silêncio do campo nem o estrondo da cidade Só a voz dum rasguido-doble num rádio às duas da tarde Rancheirio de fim de mundo erguido sobre uma linha E uma sorte que no fundo nem mesmo Deus advinha Aqui um bolicho de tábua sortido à canha e mais nada Abre quando o sol destapa e não cerra de madrugada Há um gaitero paroquiano que faz da canha o sustento Borracho faz quase um ano dormindo sobre o instrumento E um relampiado que grita "toque um tango arabalero" Que abre de amor e desdicha, de traición y desespero O gaiteiro se incorpora soltando acorde e poeira E acalma o tremor dos dedos com a cachaça brasileira E o som vai ganhando as ruas mormaço de tarde clara Vem se infiltrando nos pátios pelas cercas de taquara E neste espelho se enxerga o povo dos arrabaldes Quem deixou de ser do campo pra nunca ser da cidade Aqui um bolicho de taboa sortido à canha e mais nada Abre quando o sol destapa e não cerra de madrugada