Quando a noite mergulha tão somente No silêncio profundo das estrelas Eu escrevo outro verso à luz de velas Sem cruzeiro qualquer que me oriente Não há brisa sequer que se apoquente A bater as janelas mal-trancadas No ranger dolorido das escadas Não há mau pensamento que me fuja Ouço ao longe o piar de uma coruja E o mugido das altas madrugadas Passa o vento em estranhos rodopios Revirando o que estava tão tranqüilo Pois ninguém é capaz de persegui-lo Embaralha e retorce tantos fios Quebra as folhas de caules mais esguios Atravessa até frestas mais fechadas Descascando a pintura das fachadas Soberano, ninguém lhe sobrepuja, Ouço ao longe o piar de uma coruja E o mugido das altas madrugadas Lá distante se escuta a tempestade Avisando que está já de partida E esse cheiro de vela derretida Vai tomando as esquinas da cidade E transforma a tormenta em claridade No mormaço das ruas alagadas Só me resta o soluço das calçadas. Vou lavar minha alma na água suja, Ouço ao longe o piar de uma coruja E o mugido das altas madrugadas