José Fortuna

Estrada

José Fortuna


Você estrada de asfalto
Já foi estrada de terra
Vou caminhando sozinho
Por suas curvas e serras
Contemplando os arvoredos
Que florescem logo cedo
Nas manhãs de primavera

Deixa eu sentar ao seu lado
E lembrar aqueles dias
Que aqui passavam boiadas
E de longe a gente ouvia
O repicar do berrante
Há muitas léguas distante
O seu eco repetia

Depois veio o negro asfalto
Cobrindo tudo no chão
Areias, pedras e grama
E os rastros de caminhão
Cobrindo sinais deixados
Pelos cascos afiados
De meu cavalo alazão

Você estrada de asfalto
Hoje é estrada criminosa
Quantos já perderam a vida
Em suas curvas perigosas
É o progresso que chegou
E só lembrança deixou
Daquela era saudosa

A boiada que seguia
Ao toque do berranteiro
Pra atravessar uma estrada
Demorava um mês inteiro
Hoje vai em poucas horas
Com os bois numa gaiola
Que é o expresso boiadeiro

Motoristas tenham calma
Não atravessem a lombada
Cuidado com a neblina
E com as curvas fechadas
Não confiem só na sorte
Pra que aja menos morte
E menos cruzes na estrada

Vai negra estrada de asfalto
Os problemas carregando
Pessoas que vão e vem
Uns sorrindo, outros chorando
Outros que não voltam mais
Porque deixaram pra trás
Alguém com a mão acenando

Pessoas que vêm de longe
Trazendo n´alma a esperança
Outras que partem levando
No coração a lembrança
Mil emoções diferentes
Que vão na alma da gente
E aumentam mais na distância

Eu contemplando essa estrada
De curvas, serras e subidas
Me lembro que tenho n´alma
Uma estrada parecida
Por onde passam meus anos
De amargura e desenganos
Na longa estrada da vida

Duas viagens já fiz
Nessa estrada do passado
Nos braços de minha mãe
Quando eu fui batizado
E depois na mocidade
Levei meu bem pra cidade
De lá voltamos casados

Falta a última viagem
Que breve deve chegar
A viagem derradeira
De quem vai pra não voltar
E lá no fim dessa estrada
Na minha eterna morada
Vou pra sempre descansar