José Afonso

Como Se Faz Um Canalha

José Afonso


Conheci-te ainda moço 
Ou como tal eu te via 
Habitavas o Procópio 
Ias ao Napoleão 

Mas ninguém sabia ao certo 
Como se faz um canalha 
Se a memória me não falha 
Tinhas o mundo na mão 

Alguma gente enganaste 
(A fé da muita amizade 
Tem também as suas falhas 
Hoje fazes alianças 

A bem da Santa União 
Em abono da verdade 
A tua Universidade 
Tem mesmo um nome: Traição 

Um social-democrata 
Não foge ao Grão-Timoneiro 
Basta citar o paleio 
O major psicopata 

Já são tantos namorados 
Só falta o Holden Roberto 
Devagar se vai ao longe 
Nunca te vimos tão perto 

Nunca te vimos tão longe 
Daquilo que tens pregado 
Nunca te vimos tão fora 
Da vida do Zé Soldado 

Ninguém mais te peça meças 
No folgor dos gabinetes 
Hás-de acabar às avessas 
Barricado até aos dentes 

És um produto de sala 
Rasputim cá dos Cabrais 
Estas sempre em traje de gala 
A brincar aos carnavais 

Nos anais do mundanismo 
A nossa história recente 
Falará com saudosismo 
Dum grande Lugar-Tenente 

São tudo favas-contadas 
No país da verborreia 
Uma brilhante carreira 
Dá produto todo o ano 

Digamos pra ser exacto 
Assim se faz um canalha 
Se a memória não me falha 
Já te mandei prò Caetano

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