Jorge Palma

Monólogo de um cidadão frustrado

Jorge Palma


Penso em voz alta 
Até que ouço a mesma voz
Não fale comigo nesse tom 
Quero lá saber
Eu quero é ganhar 
Até que possa viver só 
Sem ter que dar satisfações 

Recordo o tempo 
Em que a própria noite 
Era o Pai Natal 
Com o seu saco de prendas 

Mais uma vez sonhei com uma mulher 
Que me abria as portas 
Do Palácio de César

Salta, manhã
São horas de andar 
Café, depressa
De novo atrasado 
Calma, está quase 
Lá vem o patrão
Porra, já está 
Aguentei outro dia 

Mais um sorriso
Este tem que valer por dois
Em vez do grito que não dei
Faço o meu preço
Faço o leilão
Qualquer um pode concorrer 
Mas ninguém será reembolsado, não 

Dou uma vista de olhos no jornal 
Dez mil contos por uma mansão 
Com piscina 
Vejo o relógio 
Engolir o dia 
E os preços a subir de novo 
Em Novembro 

Salta, manhã
São horas de andar 
Café, depressa
De novo atrasado 
Calma, está quase 
Lá vem o patrão
Porra, já está 
Aguentei outro dia 

Anoiteceu 
Acho que é tempo de pensar 
Mas hoje estou tão fatigado 
Outro cigarro, outra imperial 
Agora já me sinto melhor 
Se eu pudesse arranjar o Mundo 
Falas em casas debaixo do chão 
Para quando as radiações nos ameaçarem 

Caio na cama 
E fico a cismar 
Será mesmo assim 
Ou serei eu que estou louco? 

Salta, manhã
São horas de andar 
Café, depressa
De novo atrasado 
Calma, está quase 
Lá vem o patrão
Porra, já está 
Aguentei outro dia 

Porra, já está 
Aguentei outro dia