João Afonso

Sem Abrigo (nas Cidades de Ninguém)

João Afonso


Olho ao meu lado, na rua desperto 
rostos à espera de alguém 
bocas caladas tão perto, deserto 
nas cidades de ninguém 

Há no pousio desta vida, um silêncio 
de quando nos vemos sós 
e vejo contados, meus medos, meus sonhos 
no mais belo livro que eu vi 

Olho para o Tejo, navego na noite 
encosta a terra um navio 
foram-se os corvos partiram para Goa 
contam mentiras do império 

Há nas palavras perguntas respostas 
mistérios por desfazer 
um sentido cego para tudo e para nada 
no mais belo livro que eu li 

Olho a cidade no espelho das águas 
chega de longe um amigo 
com pensamentos constrói os seus dias 
e o tecto do seu abrigo 

Corto as amarras, venceu a maré 
dos mundos por descobrir 
nas margens da vida se escrevem as linhas 
do mais belo livro por vir.