Vou tenteando na cambona Já bem abaixo do meio Lá pras bandas do rodeio Ouço um berro de mamona Aqui guitarra e cordeona Chimarrão, fogo de angico O Sol já com braça e pico Neste final de janeiro Que vai indo mais ligeiro Do que soldo de milico Mateando, meio solito Porque o patrão e a peonada Já saíram pra invernada Há muito tempo, cedito O sábado está bonito E a indiada aqui da fazenda De tarde, se vai a venda E aos bolichos do caminho Ou então beber carinho Nos braços de alguma prenda Mas enquanto eu chimarreio Neste morrer de janeiro Meu pensamento chasqueiro Se aviva mascando o freio E sai a pedir rodeio Nas lembranças, retoçando Eu me paro, recordando As falas do negro lúcio Muito maior que confúcio Pra filosofar trançando E ele sempre me dizia Enquanto tirava um tento Naquele linguajar lento Cheio de sabedoria A noite é a ilhapa do dia Na argola da escuridão É quem garante o tirão Em todas as lidas sérias Neste varal de misérias Que é a existência do cristão Deus não fez rico nem pobre Peão, patrão ou capataz Isso é o destino quem faz E como é não se descobre O nobre que nasce nobre Nem sempre assim continua Pra beleza da xirua Ou cavalo de carreira Não adianta benzedeira Nem reza ou quarto de Lua Enquanto filosofava Naquele estilo sereno O semblante do moreno Parece se iluminava A vivência é que falava Naquela conversa mansa E no fundo da lembrança Inda o escuto reafirmar Parar não é descansar Porque estar parado cansa Dele mil vezes ouvi O que tem que ser será Por longe que o homem vá Jamais fugirá de si E com ele eu aprendi As cousas da natureza A fidalguia, a franqueza E aquela velha sentença Atrás da cinza mais densa Existe uma brasa acesa E chego a ouvi-lo fazer Junto dum fogo de chão Uma grande distinção Entre existir e viver Filho, dizia, morrer Não é mais do que uma viagem Por isso não é vantagem O forte fazer alarde Que, às vezes, pra ser covarde Precisa muita coragem Inda vejo o conselheiro Que evoco com devoção Naquele estilo pagão De confúcio galponeiro Que me dizia: Parceiro Nesta existência brasina Cada qual traz uma sina Que força alguma desvia E nada tem mais valia Que as coisas que a vida ensina Filho, a verdade, verdade Que nenhum sistema esconde É que o povo não tem onde Suprir a necessidade E vive pela metade Abaixo de tempo feio Vai explodir já lo creio A tampa dessa panela Nem adianta acender vela Pro negro do pastoreio Como encontrar os perdidos Num país deste tamanho Se venderam o rebanho E os homens foram vendidos Se os chamados entendidos Falam de cara risonha Defronte a crise medonha De estelionatos e orgias Quem mente todos os dias Vai ficando sem vergonha Aqui o rio grande isolado Pela mãe pátria madrasta Dia a dia mais se afasta Do poder centralizado Mesmo que guaxo pesteado Botado de quarentena Quanto ao capataz, que pena Não serve para o rio grande Na hora de ficar grande Se abatata e se apequena Na hora de dizer: Para Àqueles que nos ofendem Desrespeitam, desatendem Ao rio grande tapejara Não sei porque esconde a cara Quando a ocasião é mostrá-la Calçar o pé, erguer a fala Porque esta terra pampeana Não é a casa da mãe joana E nem tão pouco senzala Não é ofensa, capataz É que os homens desta terra Adquiriram na guerra Direito de estar em paz Dentro dum clima capaz De viver em harmonia Sem toda essa vilania De boicotes e de ameaça Que estão fazendo de graça À velha capitania A própria carne importada Lá de fora é um desaforo E o calçado, há tanto couro E gado nesta invernada E arroz da safra passada Pra que essa compra mesquinha Querem nos dobrá a espinha E nos cortar a garganta Mas rio grande não se espanta Como se faz com galinha Que lindo se o presidente Em vez de passear na Europa Passasse em revista a tropa Deste país continente E num gesto inteligente Viesse ao rio grande fronteiro Que já era brasileiro Antes mesmo de vespúcio E levasse o negro lúcio Pra servir de conselheiro