1455 A dor das chibatadas, eu sinto, eu sinto! Eu sinto o ódio tomar tudo em mim Nasci preparado pra morrer Esse não pode ser meu fim, não é assim! Que nasci pra viver, com meu sonho acorrentado Agonizando até morrer Impiedosamente, afetando minha sanidade Psicológico desgraçado, me sinto mais um covarde Vendo minha mãe chorando, implorando, eu sem poder me mexer Não me sinto um ser humano E não tem como sorrir, durmo e acordo tentando Até porque não é nada fácil com o coração sangrando E nas, alucinações, os demônios me perseguem, mas eu Pego eles antes que eles me peguem! Não posso mais deixar, ouvir mais essas vozes Meus instintos vão pulsar, inquietudes mais ferozes E seu eu der mole, bang bang Eles, só vão parar saciando o meu sangue, mas Sigo sofrendo, mantenho a calma Minha alma tem um corpo Mas meu corpo perdeu sua alma O corpo é quente, vim de uma sauna, é um trauma Estão extinguindo nossa fauna Tá tudo tão escuro, esperança já é fulgaz A fome, a sede e o sono fez de mim um incapaz E mentalmente, eu sei a guerra que eu travo Em ser mais um preto desentendido, mais um escravo nesse cais Agora? Tanto faz, de tanta surra que tomei nem sei se reconheço a paz Eu sou o ás! Mesmo sem frutos sigo audaz, suor escorre na ferida Eu sei o ódio que me traz A morte me persegue e a cada dia eu me livro A essa altura? Não sei se vivo, ou sobrevivo A fome vem de pouco em pouco nos consumindo e quando a gente menos espera Mais um tá indo! E esse sofrimento, impossível esquecê-lo, parecia um sono eterno Pra viver sempre num pesadelo E escrevê-lo da vivência ao papel Experiências que obtive me levam do inferno ao céu A carne mais barata do mercado é a carne negra Eu não quero quebrar o tabu e nem bancar o subversivo Mas com dezenove anos, nunca me senti tão vivo Eu sobrevivo, mais um preto na sua função Ó Nossa verdade se tornou minha visão Vivendo na encolha sem escolha; dentro de uma bolha Nossa história é grande e eu não sou uma folha É muita história pra contar, muita coisa vivida Foi muita batalha e muitos não encontraram uma saída E até hoje tem muito disso, rapá! Nego vem bater neurose, meu cabelo sarará Com essa de padrão, sendo a bola da vez Tu diz que meu cabelo é ruim, mas que mal ele te fez? Ruim é teu preconceito, falo e bato no peito, sente só meu conceito É bom, você ter respeito, e eu amo ser preto, meu estilo do gueto Não gostou? Chega em mim, resolvemos do melhor jeito Foi muita luta e hoje sim posso sorrir Deem saudações aos decendentes de zumbi! Nós nunca vamos parar Cê pode crer eu acredito, muitas coisas mudaram E hoje o rap é o nosso grito E se nos provocar saciarão da nossa ira Nós somos muita verdade para suas mentiras Falam que essa rima é um dom, mó treta Se tu vivesse nossa história cê faria essa letra Anos passaram e ainda olham torto Vai ter que aturar não nos contentamos com pouco Dizem que eu sou louco, vamos dar sufoco E eu ainda vou gritar mermo que um dia eu fique rouco E quem diz que é mimimi e que o racismo acabou, então vamos trocar de corpo E tu me diz o que passou, e então, tu me explica porque a gente sente O futuro chegou, não tiraram nossas correntes E nem 500 anos tornou o preto incapaz E se quiserem tornar, precisarão de muito mais De muito mais, muito mais E se quiserem tornar, precisarão de muito mais! A carne mais barata do mercado é a carne negra A nossa história tá gravada na memória De quem já teve a glória de senti-la e ouvi-la no agora Não queira em nenhum momento estar lá É muita história, muita história pra contar Tempo passou negro também é doutor, fala e honra sua cor Mas tem um pouquinho de lá Mais um preto tachado como suspeito Com três balas no peito, esses pretos não tem jeito Eu não aceito! Papo reto, não quero nem ser discreto, preto fala é favelado Branco diz é dialeto, papo reto? Mais de três busão pra chegar na profissão chega e Bate de frente ouvindo que não é padrão Satisfação, já entendi doutor, mas o padrão que é diferente E não se encaixa com a minha cor Você tem medo acha que a gente é ladrão Meu armamento me rotula como réu Eu to armado da cabeça aos pés, minha arma é fatal Eu porto caneta e papel