Sou serrano e me garanto não engulo desaforo Facilito eu risco o couro e taura que se alvorota Escoro chuva e mormaço não tremo com qualquer frio Sou dançador de bugio qualquer chinoca já nota Sei levar uma dentando depois de uma borracheira Carreguei uma cruzeira dentro do cano da bota Eu vivo lá no planalto não me encharco com garoa Cultivando a terra boa fazendo vergas no chão Levanto de madrugada e a lida bruta eu enfrento Pra garantir o sustento plantando soja e feijão Dando tiro serro acima eu escrevi meu nome E também meu sobrenome nas orelhas de um lebrão E eu por ser missioneiro comigo ninguém se invoca Bicho que é brabo se entoca e o manso corre de mim Eu tenho sangue abrugado não me assusto com pataço Quando espicho o meu braço maula deita no capim Já briguei com lobisomem tendo céu por testemunha E já limpei minhas unhas nos dentes de um graxaim Seja de cima da serra no planalto ou nas missões Enquanto pelos galpões tiver fogo e chimarrão Vai sempre ter alegria de prosa e gaita chorando E a gauchada atochando pra quem não é do rincão Pois não é que lá na serra não é que eu seja papudo Tem um pinheiro graúdo tão grande assim ninguém viu Por mais de quinhentos anos a terra firme se agüenta E enfrentou muitas tormentas tastaviou mas não caiu Hoje não é mais o mesmo com a grimpa desgalhada Mas ainda sim é morada de quatrocentos bugios Eu sei que tem árve grande em qualquer parte do mundo Mas perto de passo fundo tem uma que é bem grandinha É um pé de angico gaúcho que já está quase no cerno Mas pelo jeito é terno de mil anos se avizinha Dele fiz minha morada onde eu moro sonho e ronco Pois num buraco no tronco fiz quarto sala e cozinha De um galho de um Sarandi nas barrancas do Uruguai Fiz um rancho pro meu pai e do lado um chiqueirão Missioneiro de capricho eu fiz um lindo trabalho Com os cavacos do galho três gamelas e um pilão Fiz carreta fiz canzil canga e palanque pra cerca E ainda sobrou uma ferpa pra fazer o meu violão Seja de cima da serra no planalto ou nas missões Enquanto pelos galpões tiver fogo e chimarrão Vai sempre ter alegria de prosa e gaita chorando E a gauchada atochando pra quem não é do rincão