Ô Marcolino, sempre a gritar Longos pregões sem descansar Diz Marcolino então o que fazes tu? "Afio navalhas, facas E outras coisas mais Objetos de uso vulgar, Mas que também podem ser fatais Limpo chaminés e arranjo Os vossos jardins, Mas quando preciso e posso Também assalto os vossos quintais" Ô Marcolino, das longas viagens Diz Marcolino se outra vida tiveste O que fizeste, o que te fez mudar? "Já fui camponês, soldado E a vida foi sempre igual Insultei patrões, oficiais E nunca me senti mal Ganhava pouco, fome de cão E enchia a pança aos canibais e ainda encho Fui sempre indisciplinado, pois claro Que outra coisa posso ser então?" Ô Marcolino das longas viagens Da rosa dos ventos com direção Diz Marcolino, que já viste então? "Vi um patrão fugir ao som De uma explosão Vi uma cadela com dores Parindo polícias com cabeças de cão Contra a tese de certos doutores Vi um povo de armas na mão E um padre gritando 'socorro, ai ai' Que me corta o coração" Ô Marcolino sem medo da morte Com teu braço forte, o que vais tu fazer? Diz Marcolino, tens algo a perder? "A perder nada tenho Talvez a vida, tanto faz E na vida tenho a ganhar lutando Sozinho é que não sou capaz Mas há muitos como eu, Talvez centenas de milhares Dispostos a lutar e vencer Tudo pra frente, nunca pra trás"