Já fez de tudo na vida alambrador, peão, carreteiro Sofreu mais que boi carreiro de rolar sangue na testa Mas sempre na vida honesta, enquanto pode se virou Seu nome nunca manchou, esse orgulho ainda lhe resta Ali na sombra do rancho Mateava o velho estelito Bombeando no infinito Mil recuerdos mil saudades Mas que barbaridade Como o tempo é caborteiro De mansito e sorrateiro Se aprochega sem piedade Já nem sabe quantos anos Vem pealando no lombo Nem tampouco quantos tombos Nessa vida já levou Mas sempre se levantou Como um farrapo gaudilho Pra depois seguir no trilho Que o santo patrão riscou Velho estelito, peão da estância charrua Em quantas noites de Lua acordou antes dos galos Encilhou o seu cavalo e saiu para lidar E antes do galo cantar já estava a camperear Só por causa dessa idade Lhe tratam pior que cachorro Com eles reparte o fogo E as vezes até comida Pois quem não serve pra lida E não tem força pra ser peão Podem bem seciar no chão Nos trapos rude da lida Parece que ficar velho Se comete algum pecado Num canto fica atirado Solito quase sem nada Qual carreta abandonada E fica na chuva e vento Apodrecendo ao relento Duma tapera assombrada Velho estelito, peão da estância charrua Em quantas noites de Lua acordou antes dos galos Encilhou o seu cavalo e saiu para lidar E antes do galo cantar já estava a camperear E ao se ver nesse estado Velho, doente, sozinho Mil vezes chora baixinho No costado do galpão Esconde o rosto entre as mãos Pra ninguém ver o seu choro Tem ouvir os desaforos Que agora diz o patrão Ainda resta um consolo Velho peão não se lamente Não se fica pra semente Neste mundo de ninguém Esquece os que muito tem Que o santo patrão sagrado O seu trono bem centado Bombeia lá do além Velho estelito, peão da estância charrua Em quantas noites de Lua acordou antes dos galos Encilhou o seu cavalo e saiu para lidar E antes do galo cantar já estava a camperear E com Deus não tem conversa nem índio que não se dobre Não importa ser guasco nobre Ser desta ou daquela crença Pois ao ficar na presença da sombra fria da morte Além do fraco e do forte Já não faz mais diferença