Quem ouviu esses lamentos que avançaram noite à dentro E romperam o silêncio e a calma do sertão? Nas noites de Lua cheia pude ouvir Uma voz lá do quilombo que clamava bem assim Minha terra é lá bem longe, das bandas de onde o Sol vem Esta terra é mais bonita, mas à outra eu quero bem Lá, minha aldeia brilhava sob o céu Minha gente celebrava a vida, o vento, o Sol e o mar Um navio negreiro me trouxe pra cá Dentro de um porão imundo, a me acotovelar Com homens, mulheres, malungos, guris Era uma prisão terrível, como eu nunca vi! O senhor Deus dos desgraçados que me livre do açoite Vira-mundo, palmatória, anjinhos, tronco, pelourinho Como é possível aos deuses permitir Tamanha crueldade? Mas quem pode me ouvir? O capitão-do-mato está a me espreitar Eu temo que ele me entregue ao cruel capataz Só espero fugir pra bem longe daqui Quem sabe, voltar pra África, de onde eu saí Eu não quero os teus deuses, tuas terras, teus grilhões Só te peço liberdade e é o que negas sem perdão Quem poderá esquecer tais lamentos Vindos do breu da noite que a razão iluminou?