Eu sei como é difícil Eu já passei por isso Viver de favor Não honrar seus compromissos Acorda todo dia Sem perspectiva Dobra o joelho, reza um terço Se apega a bíblia Põe a culpa no diabo Pelas coisas que acontece Acha que resolve tudo Apenas com as preces Mais preces Não esquece Das torturas da ditadura Vida dura Do povo de pele escura Nos porões Negreiros Nas noites de amargura Aos dias de tretas Onde as tias pretas Colecionam sepulturas Suicídio Homicídio Genocídio ou loucura Sem um conto no bolso Só com ferro na cintura Choro de criança Que ecoa a luz da lua Sugando seco seios Da fome verde e amarela A morte em capítulos Da mesma novela Quase sempre Os mesmos sempre Se amontoam na celas O amor é uma flor Que quase ninguém rega Eu sei não sou exemplo Só mais um sobrevivente Um afrodescendente Escrevendo outros quinhentos Eu sei o que é a fome O susto no IML Conheço pelo nome A quem orferto as velas Minha ira, minha fúria Minha trilha não tem cura Escapei das armadilhas De quem me desconjura Minha rima É pura bala de guerrilha Produto original Da Coreia de cima Diamante lapidado Nas ruas da areinha Lá desde muleke eu cursei o favelês Aprendi, compreendi, que o inimigo é burgês Na sua festa o que é que resta Três vezes seis Escondidos em suas mansões Por trás de suas leis Muitas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora A alegria da favela, sempre se mistura Ao pé da vela na sepultura Todo ódio a quem nos oprime Todo ódio pra quem nos odeia Pra quem nos rouba orportunidade Depois nos jogam nas cadeias Eu sei muito bem quem é A que classe pertence você Por isso não chore, não clame por Deus Quando tiver na mira de uma PT Observe no fundo dos olhos O monstro que você criou Quando ele foi te pedir emprego Você negou, você humilhou Mesmo que a tua raça não queira Igualdade é a saída Se você tem carro, casa e comida O pobre também tem que ter autoestima Mesmo com tudo isso Ainda estamos vivos Mesmo que aqui o maluco troque a quadrada Que é mais fácil que um livro Não é por opção Aqui ninguem nasce ladrão Troca de poder Que se foda ostentação Não adianta querer reprimir Não adianta polícia impedir Que se organize Que apareça A nova tropa de zumbi Século XXI A paz que nós queremos Ainda não veio A paz que a burguesia quer Nessa eu não creio Seu eu to nas roças, nos presídios Ou então no cemitério Desempregado, isolado Não estou nos melhores colégios Então vem aqui me explicar Como é que eu vou aprender Pela TV? Não não Ou com o PT? Vai pro chão Aí, eu sou militante na prática Teoricamente não basta O poder e arrogância Mata Eu faço a conta exata Com as cifras das suas palavras Que você cuzão usava Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Vou levantar bem cedo Esconder o medo Vou procurar emprego Ser excluído por ser preto Eu não aceito mais Meu coração é afrobrasileiro Quero viver em paz Mas Nessa porra de país Onde nunca quis ouvir as verdades da boca de um homem preto Onde nunca se quis dar chances reais ao povo do gueto Mas pode crer periferia é meu mundo, eu sei de tudo Lá eu creci nasci sobrevivi A quase tudo E só não mudo o meu jeito de ser Tem mano que pira, desanda, cai no desespero E senta o dedo, vai pra trás das grades Morrer bem cedo O mano que foge da escola Se fode na droga Por isso tudo eu me afastei das tretas Eu fiz meu próprio mundo Muitos me chamam de careta Outros me chamam de vagabundo Sempre a pampa Sempre numa boa Preto Goes ladrão A rima em pessoa E não é atoa Que quando eu rimo A burguesia se apavora Mudaram as perguntas Quando descobri as respostas Amizade, poesia Resistência, minha história Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Não sou patriota não Meu hino é o rap que eu canto pro irmão Para que sejamos todos soldados Instrumentos da revolução Isso é cultura da periferia Aqui somos a maioria Mas se não houver justiça Sempre haverá a covardia É tipo o playboy filho da puta Que oprime a mãe de família Sejam pelos meios que forem necessários Ou toda essa porra muda Ou muita gente ainda vai pagar Com a própria vida Vão saber como é foda Perder alguém nas mãos da polícia Vão saber o quanto é foda Quando a riqueza for distribuída Vão saber o que é chorar Vão saber o que é sentir fome Vão saber o que é sangrar Então não fuja, não trema na base Quando você souber Que foice e o martelo tá na mão já é tarde Ocupar Resistir Produzir a verdade A única saída para que possamos viver na igualdade Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora Quantas histórias pra contar Periferia sangra Quantos túmulos para visitar Periferia chora