Cachorro Grande

Torpor Partes 2 & 5

Cachorro Grande


Aconteceu comigo algumas vezes
Mas duas delas foram bem diferentes
Naquela época eu só bebia naquele bar
Era um tipo de drive em que as pessoas podiam comer e beber
Enquanto lavavam seus carros

Muito estranho né?
O mais estranho é que eu não saia de lá
Alguns amigos meus também, todo mundo se chapando
Sábado principalmente!

Todos ainda tínhamos empregos normais, horários normais
E ficávamos a semana inteira pra chegar o fim de semana
De alguma coisa diferente acontecer e nada acontecia
E de repente já era domingo de noite
E batia a maior tristeza e frustração que alguém poderia ter
A ideia de começar uma semana, uma mês, um ano
E saber que vai ser a mesma coisa de sempre
E que não havia saído do maldito lugar onde eu estava

Voltando pra história do bar
Eu sentava numa mesa de frente pra rua
E ficava olhando pessoas feliz e tristes passarem
Uma vez um casal, nem feliz e nem triste
Estava passando do outro lado da rua
E atravessou em minha direção
Me olhando profundamente, como se me conhecesse

E nesse momento um carro atropelou o casal
Eu gritei com muita força e desespero
Ao mesmo tempo em que notei que o casal não existia
A não ser na minha cabeça, o carro existia, mas não parou
Até hoje não sei se vi fantasmas ou foi alucinação

Isso aconteceu em Passo Fundo, no final da década de 90
A outra, como eu disse foi bem diferente
Foi em outro lugar e outro momento
Na época pintaram os alucinógenos e eu tava dentro

Eu queria experimentar qualquer tipo de distorção da realidade
Minha filha tinha acabado de nascer
E eu não sabia o que fazer com minha vida
Me sentia muito fraco pra suportar tudo aquilo
E tudo aquilo era muito pra minha cabeça de 17 anos

A casa onde eu morava e, principalmente, meu quarto
Não ajudavam em nada, muito escuro e escondido
E entravam e saíam todo tipo de pessoas possíveis
E a maioria delas eu não queria que estivesse ali
Tamanho era o meu torpor

Às vezes eu me perguntava
Como era possível morar num lugar daqueles
Sem me dar conta de que eu era o único morador
Mas nunca me senti sozinho
Mesmo quando não havia ninguém, eu não estava sozinho

Meu maior problema era o sono
Quando eu ia dormir, eu não conseguia descansar
Todo tempo em que eu estava naquele lugar
Eu me senti muito pesado, carregado e isso nunca aliviava

Meus sonhos também estavam muito confusos
E estava difícil separar eles da vida real
Me sentia sufocado enquanto dormia
E cansado e fraco, quando acordado

Até hoje não sei se eram espíritos
Ou era só loucura
Isso aconteceu em Uberlândia
No começo da década de 90
Paz e amor