Sempre a perdoar Sem ter paz um anjo não pode voar Por favor se acomode, à vontade se sinta para me contar Toda a verdade contida, escondida no fundo desse seu penar Como não sei das perguntas, respostas não tenho só vou te escutar Mas sem delongas te aviso que eu cobro por hora e por isso não vá demorar Então seu doutor, essa aqui é a minha história Quando eu era mais nova, doutor o meu pai vinha louco do bar Socava a minha irmãzinha, quebrava as cadeiras e jurava matar Eu já ficando mocinha na maldade ele vinha pro me olhar E minha mãe se fingia de cega e de surda pra não apanhar Para os vizinhos do lado, ele era homem direito, cidadão exemplar Mas do portão para dentro de casa ele vinha com ódio no olhar E quando a noite chegava e o meu sono tardava a me visitar Lá no fundo eu sabia que o que eu mais temia logo iria recomeçar Sempre a perdoar, sem ter paz um anjo não pode voar Enquanto me abusava movido a álcool jurava me amar E eu calada sofria e com ele dormia sem paz e a chorar Hoje ele jaz dessa terra e até mesmo sem vida vem me atormentar De herança deixou-me essas tristes lembranças que eu tento apagar Tudo enfim deu errado e levou-me a um lado difícil de estar Hoje vivo vagando e só tenho o meu corpo para te pagar Mas sem delongas te aviso que eu cobro por hora e por isso não vá demorar Quando o meu tudo era o teu nada e entre o nada não contente Eis que vi não de repente a tua paz tão poluída Diluindo a minha vida como fez quando serpente E ainda assim de mau-presente arrancou-me o que era dia E bem com ele o que me ardia apagou-se em mão selada A minha fé encurralada decidiu por suicídio E ao cantar agora eu vivo para não ver de novo a estrada Onde deixei minhas pegadas e a inocência enfim perdida Sempre a perdoar Sem ter paz no mundo um anjo passa a odiar